Foto: Reprodução Twitter
Há alguns dias vivenciamos um evento nacional de proporções mundiais. As eleições nos Estados Unidos da América, que estão em sua fase final de contagem dos votos, apresentou o presidente eleito, Joe Biden (D), à comunidade internacional. Em uma eleição histórica, com recordes de votação, o 46º presidente da potência norte americana sinalizará algumas mudanças de paradigmas na política internacional.
Mas para entendermos os impactos da não reeleição de Donald Trump, é preciso compreender, primeiramente, o sistema eleitoral estadunidense. Com um sistema de votação secular, os norte-americanos votam em cédulas de papel, indicando a sua preferência para presidente, deputados, senadores a nível federal, assim como deputados, senadores e governadores em nível estadual. Os votos por correspondência foram amplamente utilizados nesta eleição em razão da pandemia.
A grande distinção do sistema eleitoral estadunidense do brasileiro é a existência do colégio eleitoral. Os 538 delegados são escolhidos previamente pelos partidos em cada estado. Dessa forma, é tradição que o candidato a presidente que obtiver a maioria simples dos votos naquele estado leve consigo os votos de todos os delegados, com exceção de Nebraska e Maine. Por esse motivo, mesmo as eleições colegiadas ocorrerem oficialmente em dezembro, se estima o resultado das eleições quando um candidato obtém a maioria absoluta dos votos delegados. Ou seja, 270 ou mais. Biden é tido como vitorioso pois já possui, no momento da redação deste texto, 290 delegados conquistados.
Mas quais serão os possíveis cenários com o retorno do Partido Democrata ao poder?
Tradicionalmente, os Democratas possuem maior consideração e apreço ao multilateralismo, priorizando as instituições internacionais na condução da sua política externa. Sendo assim, é esperado que o presidente eleito inclua na agenda o retorno à participação em organizações-chave, como a OTAN, OMS, OMC e, de maneira geral, a própria ONU, desconsideradas ou abandonadas no governo Trump.
O que se percebe de imediato é que Biden alterará a maneira como os Estados Unidos estão lidando com a crise do coronavírus. O presidente eleito já formou uma equipe de assessores e técnicos, intitulada Trasition46 (em referência ao número de sua presidência), que visa estudar e trabalhar prioritariamente quatro eixos: pandemia, recessão econômica, mudança climática e racismo sistêmico.
No que se refere à Covid-19, a equipe do democrata indicou que a gestão se comprometerá com o abastecimento de materiais sanitários, como máscaras, aventais e equipamentos; maior incentivo ao distanciamento social, assim como projeta-se a elevação na testagem e no rastreamento do vírus.
O Meio Ambiente se mostrou um ponto de tensão crescente nos últimos dias, especialmente para o Brasil, pois Biden já havia sinalizado em sua campanha que, se eleito, iria pautar a situação do desmatamento e das queimadas na Amazônia na agenda internacional. Durante os últimos dias, novamente o presidente eleito teria feito menção à questão da Amazônia, indicando possíveis sanções econômicas ao Brasil caso o desmatamento não fosse reduzido. Em resposta, o presidente Bolsonaro, que até não havia se pronunciado sobre a vitória do democrata, teria considerado as falas em relação à Amazônia uma possível ameaça a soberania, indicando que somente a diplomacia não seria capaz de resolver o impasse.
Contudo, já espera-se, em Brasília, que haja mudança na configuração da chefia do Itamaraty ou na embaixada brasileira nos EUA. Desse modo, a expectativa é que se escolha um interlocutor mais moderado, a fim de manter o pragmatismo da diplomacia brasileira de forma a não prejudicar profundamente as negociações e articulações entre os dois países.
Mas apesar de serem apresentadas mudanças importantes na política interna e externa norte-americana, também projeta-se que algumas questões centrais não sofrerão grandes mudanças no governo democrata. A principal delas é em relação ao protecionismo. Biden já indicou que executará o plano Buy American, plano de valorização da indústria nacional, a fim de gerar novos empregos, em contraponto à recessão econômica.
E, por fim, há grandes expectativas em relação ao posicionamento do presidente para com a República Popular da China. Estima-se que a política de contenção ao país asiático continuará, entretanto Biden buscará apoio dos países aliados aos Estados Unidos em detrimento das sanções unilaterais executadas no governo Trump.
Portanto, a escolha de Biden, um político tradicional, moderado e pragmático, como candidato democrata revelou a preocupação do partido em lançar um nome que pudesse angariar os votos dos eleitores que se decepcionaram com o governo de Donald Trump. Além disso, pode-se afirmar que o descaso na condução da pandemia por parte do atual presidente foi um dos fatores decisivos para a vitória de Joe Biden nas urnas, levando Trump a ser o único presidente estadunidense a não se reeleger em 28 anos.
Fontes:
“Apenas na Diplomacia não Dá” Diz Bolsonaro ao Citar Proposta de Biden sobre Amazônia. O Globo. 10 de novembro de 2020. Disponível em: <oglobo.globo.com/mundo/apenas-na-diplomacia-nao-da-diz-bolsonaro-ao-citar-proposta-de-biden-sobre-amazonia-1-24739152>.
Biden Eleito: 6 Pontos-Chave do Plano do Democrata para e Economia dos EUA. BBC Brasil. 10 de novembro de 2020. Disponível em: <www.bbc.com/portuguese/internacional-54891069> .
Biden Eleito Presidente: Como Ele Vai Mudar a Política Externa dos EUA. BBC Brasil. 10 de novembro de 2020. Disponível em: <www.bbc.com/portuguese/internacional-54872055>.
Biden e Harris lançam as bases de seu Governo nos EUA com guinada sobre medidas de Trump. El País Brasil. 9 de novembro de 2020. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/internacional/2020-11-09/biden-e-harris-lancam-as-bases-de-seu-governo-nos-eua-com-guinada-sobre-medidas-de-trump.html?rel=mas>
Biden’s Policy Agenda Rests Heavily on Senate Outcome. New York Times. 11 de novembro de 2020. Disponível em: <www.nytimes.com/2020/11/11/business/biden -policy-agenda.html?action=click&module=Spotlight&pgtype=Homepage>.
Eleições nos EUA: Inflexões e Impacto sobre o Brasil. Nexo Jornal. 01 de novembro de 2020. Disponível em: <www.nexojornal.com.br/ensaio/2020/Elei%C3%A7% C3%B5es-nos-EUA-inflex%C3%B5es-e-impacto-sobre-o-Brasil>.
Especialistas Avaliam Impactos da Eleição Americana no Brasil. Correio Braziliense. 4 de novembro de 2020. Disponível em: <www.correiobraziliense.com. br/politica/2020/11/4886673-especialistas-avaliam-impactos-da-eleicao-americana-no-brasil.html>.
Escrito por: Miguel da Silva Rodrigues[1] [1] Acadêmico de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
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